quarta-feira, maio 02, 2007

da filosofia e do seu uso corrente

A palavra filosofia anda na boca de meio mundo. Os portugueses usam-na a torto e a direito como se durante toda a sua vida mais não tivessem feito do que lidar tu cá tu lá com os mesmos problemas com que lidaram Platão, Descartes, Kant, Bertrand Russell ou Wittgeinstein. É evidente que o uso do termo não tem que pressupor sempre e necessariamente uma familiaridade com as questões filosóficas ou com os autores que à reflexão crítica dos problemas dedicaram muitos dos anos da sua vida. Mas o seu (ab)uso corrente e nos contextos em que habitualmente se emprega o termo, neste país de gente palradeira e de opinar ligeiro, é no mínimo estranho e dá que pensar.
Imagine-se uma equipa de ETs que se ocupa com a investigação dos terráqueos. O seu conhecimento do uso das palavras é enciclopédico, exaustivo e rigoroso, fruto de uma base de dados onde estão armazenados todos os melhores produtos da cultura produzida pela humanidade. Se deparassem com o uso corrente que os portugueses fazem do termo filosofia, que ideia fariam de nós? Certamente que se tratava de um povo singular, porventura o resultado de uma tradição cultural viva e de um sistema de ensino cuja preocupação principal seria a de formar seres humanos com autonomia crítica e agilidade reflexiva a toda a prova.
A propósito do assunto Eduardo do Prado Coelho escreveu um texto intitulado "A decadência da filosofia" (Público, 8/6/2004):
Durante o relato do jogo Porto-Mónaco na televisão, alguém declarou que os dois treinadores incarnavam uma nova filosofia do futebol. Não cheguei a perceber se se tratava de verdadeiras inovações tácticas, mas penso que a questão era outra: considerar no trabalho com os jogadores os aspectos psíquicos, e sobretudo emocionais. (...) E a palavra "filosofia" parece hoje menos presente nos jornais de cultura do que nos jornais desportivos. (...) disse Pinto da Costa (sobre o treinador) "Depois de o conhecer, de ter conversado com ele várias horas, de ter compreendido a sua filosofia e depois de ele compreender a minha (...)". É triste que a palavra "filosofia" ande tanto por caminhos tão insólitos. Os publicitários têm uma filosofia, os dirigentes desportivos têm uma filosofia, os guarda-nocturnos também têm."

Um comentário:

Anônimo disse...

a minha mulher a dias também tem uma filosofia E não é por isso que é mais desempoeirada. Chico da popeline