quarta-feira, maio 16, 2007

confrontos em matéria educativa

É triste. De tão triste que é, torna-se patético, confrangedor. Refiro-me ao debate sub-reptício que colocou em confronto - faz já algum tempo e por isso talvez convenha recordar - a Sra. Ministra da Educação, a professora Maria de Lurdes Rodrigues, e o Presidente da Sociedade Portuguesa de Matemática, o professor Nuno Crato, autor de algumas das páginas mais críticas e esclarecedores que se têm escrito a propósito das questões educativas da actualidade. É necessário precisar. Quando recorro à adjectivação, atribuo-a integralmente às palavras da primeira opositora ao debate e não às do segundo. Porque é de avaliar as palavras que se trata. Mas detenhamo-nos no que de essencial revela a contenda.
O professor Nuno Crato, a propósito da proposta de alteração ao Estatuto da Carreira Docente, afirma que “a palavra ensinar não aparece uma única vez no documento”. Chama-lhe uma curiosidade. Convém lembrar que a curiosidade é a alma da investigação e um inequívoco sintoma de atitude crítica. O que revela esta curiosidade? No entender do professor, a referida ausência reflecte “uma orientação pedagógica vincada”, talvez mesmo uma orientação ideológica, que transparece no “eduques” do Ministério. É conhecida a postura fundamentadamente crítica do investigador no que concerne às políticas e ao jargão pedagógicos dominantes, alicerçados em pressupostos românticos e construtivistas. Neste contexto é que a análise hermenêutica do professor deve ser avaliada, na sua tentativa de expor na sua nudez mais simples o sentido e a pertinência da actual política educativa. Que sentido e que pertinência? O do vazio e da ausência de políticas reformistas sérias em matéria de educação, as únicas capazes de enfrentar os problemas reais subjacentes ao sistema de ensino e de dotar o país de autênticas perspectivas de futuro.
Não é este o entendimento da Sra. Ministra da Educação, ela que se tem caracterizado por uma postura rígida, fechada ao diálogo e por um voluntarismo dogmático que já não se usa, passados que estão 32 anos depois da ditadura. Vontade a mais e entendimento a menos. Vontade cega, que é a mais nociva das vontades. É por isso que o seu discurso é triste, patético e confrangedor. De tão cego, não enxerga as próprias contradições. E são tantas, que só uma opinião pública, intoxicada por medias subservientes e acríticos, não consegue entrever. As suas afirmações são disso testemunho. Basta pegar na entrevista que deu à Visão de 22 de Junho de 2006 e respigar duas ou três. “Não tenho por objectivo refundar nem efectuar reformas, mas sim fazer cumprir determinados desígnios e objectivos”, em prol de “uma grande mudança”. Como disse? Será possível fazer uma grande mudança na educação do país sem efectuar reformas profundas? O antigo sistema de avaliação (…) não avaliava (…) ninguém sabe quem são os bons, os maus ou os excelentes.(…) Os conselhos executivos sabem quem são os bons professores das suas escolas.” Como disse? Alguns sabem não contradiz ninguém sabe? Semelhante erro básico de lógica, poucos alunos do ensino secundário cometem, Sra. Ministra. Relativamente ao facto do termo ensinar estar ausente do Estatuto proposto: “Não é verdade. Aparece várias vezes”. Como disse? Será que ignora o documento? Ou trata-se de má-fé? E porquê acrescentar: “Acho que as questões técnicas da pedagogia não devem vir para a esfera da actividade política.” O que quis dizer exactamente? Será que a actividade política não tem competência para abordar aquelas questões? E hão-de tê-la os pais? Com tamanha falta de entendimento em questões pedagógico-educativas, sem vontade reformista séria e consequente (quando urgia que ela se fizesse, em benefício de todos), sem atitude crítica, não se percebe como pode a Sra. Maria de Lurdes Rodrigues continuar teimosamente a exercer um cargo para o qual alguns lhe reconhecem competência. Felizmente menos, à medida que o tempo passa.

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