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segunda-feira, novembro 29, 2010

Todo o discurso é ideológico

Todo o discurso é ideológico. Particularmente o político, no sentido em que declara opções e selecciona alternativas. E, em nome de uma específica concepção do bem comum, decide-se por uma configuração do mundo que considera preferível às demais. Fazendo-o, elege, entre outras coisas, um modelo de justiça, assim como o modo como se distribui a riqueza. Também o discurso da economia não é imune à ideologia. Por isso é plural e, como não podia deixar de ser, enuncia coisas diferentes, em função de diversos entendimentos acerca de como produzir e repartir a abundância ou a escassez dos bens disponíveis. Por conseguinte, não surpreende encontrar diferenças entre os discursos keynesiano e hayekiano, ou entre o daqueles que defendem as virtudes de uma economia regulada (pelo Estado) ou auto-regulada (pelo mercado). Isto para não falar de um discurso heterodoxo, que apela para a necessidade urgente, para garantir a sustentabilidade do planeta, de se optar pela via do decrescimento económico.
Apesar disso, assiste-se hoje à hegemonia de um discurso económico, que pretende constituir-se como uma dogmática a caucionar. Apresenta-se a si próprio com a roupagem asséptica da evidência matemática, moldada por argumentos de inevitabilidade que dispensam controvérsia. Sobretudo exibe-se como isenta de ideologia, quando na verdade esconde uma ideologia bem definida. Acabar com as políticas sociais ou reduzi-las ao insignificante e, de certo modo, com a necessidade de decisões democráticas, fazendo passar opinião pública (manipulada) por espaço público de discussão, está no ADN da ideologia económica hoje dominante. O problema é que também assistimos à submissão total do discurso político a este tipo de discurso, que ambiciona passar por único se diz portador da verdade indisputável.

domingo, maio 03, 2009

Razões para uma política participativa

Este é um ano decisivo, dizia-me um amigo. Um ano de decisões e, por conseguinte, de oportunidades. Sobretudo oportunidades de participar na mudança que, espero, se avizinha. Sejamos, pois, protagonistas da mudança. Protagonistas menores, mas ainda assim protagonistas. Façamos de conta que este é o patamar originário de um futuro melhor a construir, ou, como dizia o Sérgio Godinho: "o primeiro dia do resto da tua vida".
Vivemos tempos de crise, não só económica. Porque somos modernos, não poderia ser de outro modo, uma vez que a crise é o rosto visível da modernidade que nos cabe cumprir. Mas não se pode falar de crise sem falar de crítica. São como dois bois aparelhados para levar para diante a mesma demanda. Só uma postura crítica fará da crise o combustível da mudança desejada. Em termos cidadania, não nos resta outra alternativa válida que não seja a de nos assumirmos como "animais políticos". Não se trata de apenas de relembrar o velho Aristóteles. Trata-se, antes do mais, de não enjeitarmos a oportunidade de cumprirmos a humanidade plena que nos percorre a existência. Sejamos por isso mesmo políticos, não nos esquecendo que a política é, acima de tudo, a arte de inventar o futuro - o nosso e o dos nossos filhos. Reneguemos pois o argumento da inevitabilidade, tantas vezes usado para nos passar um atestado de menoridade intelectual e política. Não cometamos o erro de entregar nas mãos dos políticos profissionais a tarefa de tecer as malhas de um futuro comum que mais tarde vamos lamentar. Não nos alheemos ainda mais do mundo que é também público.
Se existe alguma nota fundamental que componha o projecto da modernidade, ela não pode ser outra senão a revolução democrática. A democracia, ainda que se lance as suas raízes em solo grego, tem na modernidade a atmosfera propícia ao seu desenvolvimento. No entanto, também hoje o programa democrático - que não é outro que não seja o da realização dos ideais da liberdade e da igualdade - está em crise. É imperioso que procedamos a uma crítica da razão democrática. Esta crítica torna possível duas coisas: evidenciar as condições de possibilidade do exercício democrático, por um lado, e radicalizar a democracia, por outro. O que se pretende, com isso, não é contribuir para a descredibilização da democracia, mas tão somente cuidar dela como o mais precioso dos bens que, para nós portugueses, o 25 de Abril conquistou. Tal como uma planta, ou a alimentamos ou morre.
A propósito da reflexão política, aponto duas sugestões de leitura:
1) "A incompetência democrática", Philippe Breton, Edições Loyola, 2008 (o original é de 2006).
2) "O regresso do político", Chantal Mouffe, Gradiva, 1996 (o original é de 1993).