O Primeiro-Ministro e a ministra da educação reagiram de modo concertado à manifestação dos 120 mil professores e à sua exigência de pôr fim ao kafkiano modelo de avaliação de professores. Outra coisa não seria de esperar. Quem esperava outra reacção, da parte do executivo e da tutela, ou é ingénuo ou está de tal forma desesperado que não conseguia perceber o óbvio. Não quero dizer com isto que os dois políticos têm razão, longe disso. Nenhuma ou muito pouca razão lhes assiste neste diferendo. E se alguma tiveram (na consideração de que a progressão na carreira docente deveria passar obrigatoriamente por alguma espécie de prova de mérito), depressa deixaram de a ter, ao propor um modelo de avaliação assente na burocracia, na arbitrariedade, na injustiça relativa, que tudo pode promover menos o mérito. Aliás, as políticas educativas deste governo cedo evidenciaram um só rumo e uma só estratégia, a saber, reduzir custos e hostilizar a classe docente, diminuir a sua imagem junto da opinião pública ao grau zero de importância. Por isso – recordam-se – começaram por montar uma máquina de desinformação e de propaganda anti-professor. Eles eram uns “baldas” incorrigíveis, absentistas crónicos, os verdadeiros responsáveis pelo estado calamitoso das aprendizagens dos nossos estudantes. E ainda por cima formavam uma corporação ensimesmada, preocupada apenas com o seu bem-estar e orquestrada por sindicatos manipulados pelo PCP. Se a imagem do professor vinha sofrendo a erosão própria da democratização dos costumes e das ideias, sob o pressuposto do igualitarismo e do nivelamento que acompanha todo o processo histórico da modernidade, rapidamente se transformou no bode expiatório de todos os males educativos. Vilipendiada e ofendida, sofrendo ataques de todas as latitudes, e incapaz de responder eficazmente às acusações de que era alvo, porventura fruto de algum sentimento de má-consciência, a classe soçobrou animicamente e permitiu que lhe depusessem sobre a cerviz a canga da ignomínia. Aceitou a fractura mais fatal de que ainda hoje se lamenta amargamente: a divisão torpe e mesquinha de carreiras (professor e titular). A partir daí sentiu na garganta o fel e o veneno que pouco a pouco a asfixiam. Isso explica o abandono precoce de tantos professores nos últimos dois anos. Reagiram tarde, mas mais vale tarde que nunca. Em oito meses foram protagonistas de duas manifestações históricas. A última, a de ontem, teve dimensões epopeicas, e fez certamente tremer o adversário. Mas na política, há que acima de tudo salvar as aparências. Do meu ponto de vista, José Sócrates e Maria de Lurdes Rodrigues não poderiam ter reagido de outra forma. É a crónica das reacções anunciadas. Por várias razões. Primeira: não possuem uma cultura democrática suficiente para que tal fosse possível. Segunda: não seria o momento oportuno, em virtude da “realpolitik” que pauta a sua prática governativa. Terceira: aguarda que a tormenta passe e/ou que os professores joguem o jogo de "faz de conta" da avaliação, indo ao encontro daquilo que a ministra da educação preconiza. Entretanto, na semana que vem qualquer “fait divers” económico político ou outro, oportunamente passará para os tablóides mediáticos e relegará o acontecimento de ontem para o rol dos esquecidos. Pelo menos até à próxima, que pelo vistos, estará para breve.
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