domingo, julho 01, 2007

O seu a seu dono


Ninguém me convence do contrário. Existe certamente um qualquer princípio osmótico que filia umbilicalmente os cães a seus donos. Não. Não se trata apenas da osmose dos traços de carácter. Isso é evidente. Donos rabugentos, conflituosos ou rufias geram, na maioria dos casos, cães desconfiados, agressivos e perigosos. Do que se trata é de um tipo de identificação plástica que faz com que os cães ou as cadelas – há que referir ambos em prol do discurso politicamente correcto – assumam, muitas vezes, uma similitude flagrante com as pessoas que os têm a seu cargo. Que provas tenho eu disso? Inúmeras, como devem imaginar, agora que me tornei um assíduo frequentador de locais em que os donos levam os seus canídeos a passear. Nunca antes imaginei fazer amizades com pessoas estranhas. Amizades é porventura uma palavra forte, excessiva. Em abono da verdade não lhe chamarei tal. Afinidades talvez. Afinidades caninas. São precisamente estas que me põem em contacto com gente de toda a espécie e figura: a senhora de cabelo grisalho e encaracolado que passeava pela trela o seu sósia caniche; o jovem imberbe e borbulhento arrastava o seu rafeiro também ele cravejado de pústulas faciais; a adolescente escanzelada de anoréctica que vigiava sofregamente a sua cadela esgalgada; a quarentona nutrida de carnes e de olheiras carregadas que cumulava de beijos lambidos o seu terrier com auréolas negras ao redor dos olhos; o indivíduo com ar de GNR e bochechas a pender devido à força gravítica que fustigava verbalmente o seu buldogue de beiçolas caídas. Enfim, só tenho pena de não andar munido de uma máquina fotográfica para retratar com objectividade o que acabo de descrever. Paciência. O decoro não o permite, nem a boa educação. O meu cão, felizmente, tem um ar jovial, alegre, bem disposto, dotado de bem porte e pêlo luzidio. Pela descrição, devem adivinhar a minha figura, modéstia à parte. Fiel à minha convicção, coloquei uma fotografia do meu “Tota” no topo da página do meu blogue.

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