Ontem, ao fim do dia, conheceram-se os resultados. A esmagadora maioria das escolas do país ratificou, em plenário, o “memorando de entendimento” estabelecido entre a Plataforma de Sindicatos de Professores e o Ministério da Educação. Passando por cima da nomenclatura e da hipotética distinção semântica entre entendimento e acordo – que Santana Castilho refere num artigo publicado no Público de hoje -, os sindicatos voltaram a cantar vitória. As perguntas que se impõem são? Em que se traduziu e se traduzirá esta proclamada vitória? Seguramente, em derrota não assumida. O que se ganhou com o entendimento? Ninharias. E por ninharias se canta vitória, que soa a canto do cisne. O que se perdeu? Tudo, ou quase tudo. Perdeu-se a oportunidade de capitalizar a força demonstrada pelos professores, nos idos de Março. Perdeu-se o momento oportuno para reclamar a dignidade profissional longo tempo espezinhada por uma tutela sem escrúpulos. E perdeu-se sobretudo a força necessária para lutar por uma escola mais justa e de melhor qualidade. Os dados estavam lançados. A jogada era de risco, sabia-se. Mas o adversário estava de rastos, sem energia. Cabia aos sindicatos ter a coragem de assumir o risco justificado e de – lendo correctamente a situação política – não se acovardarem, jogarem a cartada decisiva e certa, não cedendo a chantagens e a interesses mesquinhos. Afinal, pouco tinham a perder e muito a ganhar. É por estas e por outras que assistimos à agonia dos sindicatos.
Mais atentemos nas palavras de quem merece ser ouvido (Santana Castilho):
“Comecemos por uma questão semântica: entendimento e acordo são vocábulos sem difeerenças, do ponto de vista da significação, que justifiquem o esforço da Plataforma Sindical para os distinguir. Vão a um bom dicionário. No contexto que "aproximou" sindicatos e ministério, são sinónimos. Mas se essa fosse a questão, então capitular dirimia o conflito. E não estou a ser irónico. Voltem a um bom dicionário.
Posto isto, passemos ao que importa. Ministério e sindicatos acertaram, concertaram sob determinadas condições. No fim, os sindicatos cantaram vitória. Permitam-me que invoque alguns argumentos para desejar que os sindicatos não voltem a ter outra vitória como esta.
A actuação política deste Governo e desta ministra produziu diplomas (estatuto de carreira, avaliação do desempenho, gestão das escolas e estatuto do aluno) que envergonham aquisições civilizacionais mínimas da nossa sociedade. A rede propagandística que montaram procurou denegrir os professores por forma antes inimaginável. Cortar, vergar, fechar foram desígnios que os obcecaram. Reduziram salários e escravizaram com trabalho inútil. Burocratizaram criminosamente. Secaram o interior, fechando escolas aos milhares. Manipularam estatísticas. Abandalharam o ensino com a ânsia de diminuir o insucesso. Chamaram profissional a uma espécie de ensino cuja missão é reter na escola, a qualquer preço, os jovens que a abandonavam precocemente. Contrataram crianças para promover produtos inúteis. Aliciaram pais com a mistificaação da escola a tempo inteiro (que sociedade é esta em que os pais não têm tempo para estar com os filhos? Em que crianças passam 39 horas por semana encerradas numa escola e se aponta como progresso reproduzir o esquema no secundário, mas elevando a fasquia para as 50 horas?). Foram desumanos com professores nas vascas da morte e usaram e deitaram fora milhares de professores doentes (depois de garantir no Parlamento que não o fariam). Promoveram a maior iniquidade de que guardo recordação com o deplorável concurso de titulares. Enganaram miseravelmente os jovens candidatos a professores e avacalharam as instituições de ensino superior com a prova de acesso à profissão. Perseguiram. Chamaram a polícia. Incitaram e premiaram a bufaria. Desrespeitaram impunemente a lei que eles próprios produziram. Driblaram leis fundamentais do país. Com grande despudor político, passaram sem mossa por sucessivas condenações em tribunais. Fizeram da imposição norma e desrespeitaram continuadamente a negociação sindical. Reduziram a metade os gastos com a Educação, por referência ao PIB. No que era essencial, no que aumentaria a qualidade do ensino, não tocaram, a não ser, uma vez mais, para cortar e diminuir a exigência e castrar o que faz pensar e questionar.
A questão que se põe é esta: por que razão esta gente, que tanto mal tem feito ao país e à Escola, que odeia os professores, que espezinhou qualquer discussão ou concertação séria, que permaneceu irredutível na sua arrogância do quero, posso e mando, de repente, decidiu ‘aproximar-se’ dos sindicatos? A resposta é evidente: porque os 100.000 professores na rua, a 8 de Março, provocaram danos. Porque a campanha eleitoral começou a reparar os estragos para garantir mais quatro anos.
O tempo e a oportunidade política da plataforma sindical aconselhava uma firmeza que claudicou. Porque quem estava em posição de impor contemporizou. Porque de um dia para o outro se esqueceram as exigências da véspera. Porque quem demandou a lei em tribunal pactuou com uma farsa legal. Porque quem acusou de chantagem acabou a negociar com o chantagista. Porque quem teve nos braços uma unidade de professores nunca vista pensou pouco sobre os riscos de a pôr em causa.
É verdade que os sindicatos ganharam uns trocos. Mas o lance não era para trocos. Era para devolução integral: da dignidade perdida. Aqui chegados, permitam-me a achega: pior que isto é não serem capazes de superar isto. E lembrem-se de Pirro, quando agradeceu a felicitação pela vitória: ‘Mais uma vitória como esta e estou perdido’.”
“Comecemos por uma questão semântica: entendimento e acordo são vocábulos sem difeerenças, do ponto de vista da significação, que justifiquem o esforço da Plataforma Sindical para os distinguir. Vão a um bom dicionário. No contexto que "aproximou" sindicatos e ministério, são sinónimos. Mas se essa fosse a questão, então capitular dirimia o conflito. E não estou a ser irónico. Voltem a um bom dicionário.
Posto isto, passemos ao que importa. Ministério e sindicatos acertaram, concertaram sob determinadas condições. No fim, os sindicatos cantaram vitória. Permitam-me que invoque alguns argumentos para desejar que os sindicatos não voltem a ter outra vitória como esta.
A actuação política deste Governo e desta ministra produziu diplomas (estatuto de carreira, avaliação do desempenho, gestão das escolas e estatuto do aluno) que envergonham aquisições civilizacionais mínimas da nossa sociedade. A rede propagandística que montaram procurou denegrir os professores por forma antes inimaginável. Cortar, vergar, fechar foram desígnios que os obcecaram. Reduziram salários e escravizaram com trabalho inútil. Burocratizaram criminosamente. Secaram o interior, fechando escolas aos milhares. Manipularam estatísticas. Abandalharam o ensino com a ânsia de diminuir o insucesso. Chamaram profissional a uma espécie de ensino cuja missão é reter na escola, a qualquer preço, os jovens que a abandonavam precocemente. Contrataram crianças para promover produtos inúteis. Aliciaram pais com a mistificaação da escola a tempo inteiro (que sociedade é esta em que os pais não têm tempo para estar com os filhos? Em que crianças passam 39 horas por semana encerradas numa escola e se aponta como progresso reproduzir o esquema no secundário, mas elevando a fasquia para as 50 horas?). Foram desumanos com professores nas vascas da morte e usaram e deitaram fora milhares de professores doentes (depois de garantir no Parlamento que não o fariam). Promoveram a maior iniquidade de que guardo recordação com o deplorável concurso de titulares. Enganaram miseravelmente os jovens candidatos a professores e avacalharam as instituições de ensino superior com a prova de acesso à profissão. Perseguiram. Chamaram a polícia. Incitaram e premiaram a bufaria. Desrespeitaram impunemente a lei que eles próprios produziram. Driblaram leis fundamentais do país. Com grande despudor político, passaram sem mossa por sucessivas condenações em tribunais. Fizeram da imposição norma e desrespeitaram continuadamente a negociação sindical. Reduziram a metade os gastos com a Educação, por referência ao PIB. No que era essencial, no que aumentaria a qualidade do ensino, não tocaram, a não ser, uma vez mais, para cortar e diminuir a exigência e castrar o que faz pensar e questionar.
A questão que se põe é esta: por que razão esta gente, que tanto mal tem feito ao país e à Escola, que odeia os professores, que espezinhou qualquer discussão ou concertação séria, que permaneceu irredutível na sua arrogância do quero, posso e mando, de repente, decidiu ‘aproximar-se’ dos sindicatos? A resposta é evidente: porque os 100.000 professores na rua, a 8 de Março, provocaram danos. Porque a campanha eleitoral começou a reparar os estragos para garantir mais quatro anos.
O tempo e a oportunidade política da plataforma sindical aconselhava uma firmeza que claudicou. Porque quem estava em posição de impor contemporizou. Porque de um dia para o outro se esqueceram as exigências da véspera. Porque quem demandou a lei em tribunal pactuou com uma farsa legal. Porque quem acusou de chantagem acabou a negociar com o chantagista. Porque quem teve nos braços uma unidade de professores nunca vista pensou pouco sobre os riscos de a pôr em causa.
É verdade que os sindicatos ganharam uns trocos. Mas o lance não era para trocos. Era para devolução integral: da dignidade perdida. Aqui chegados, permitam-me a achega: pior que isto é não serem capazes de superar isto. E lembrem-se de Pirro, quando agradeceu a felicitação pela vitória: ‘Mais uma vitória como esta e estou perdido’.”
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