quinta-feira, março 13, 2008

o neoliberalismo é uma "doxa" a combater

A propósito do problema do livre-arbítrio, os defensores da tese determinista costumam apresentar um argumento que, por ser logicamente válido, consideram a prova irrefutável da inexistência de quaisquer acções livres. O argumento tem um nome – chama-se argumento da inevitabilidade – e traduz-se mais ou menos no seguinte: se alguém age livremente, poderia ter agido de outro modo. Ora, ninguém poderia ter agido de modo diferente daquele que de facto age. Logo, ninguém é livre. Apesar de formalmente inatacável, este argumento não prova que a conclusão seja verdadeira. Prova apenas que, se aceitamos a verdade das premissas, então não podemos deixar de aceitar, inevitavelmente, que somos em absoluto determinados por factores sobre os quais não temos domínio. Basta, no entanto, não aceitarmos uma das premissas, designadamente a segunda, para nos encararmos como algo mais do que simples marionetas ou um mero joguete de forças cegas e impiedosas.
O neoliberalismo é-nos apresentado hoje como uma inevitabilidade. Pierre Bourdieu, numa palestra proferida em Atenas – O mito da “mundialização” e o estado social europeu –, em Outubro de 1996, afirma: “ É assim que, afinal de contas, o neoliberalismo se apresenta com todas as aparências de inevitabilidade. Há todo um conjunto de pressupostos que são impostos como se fossem óbvios: admite-se que o crescimento máximo, e portanto a produtividade e a competitividade, são o fim último e único das acções humanas; ou que não é possível resistir às forças económicas. Ou ainda, pressuposto que funda todos os pressupostos da economia, procede-se a um corte radical entre o económico e o social, este posto de parte e abandonado aos sociólogos, como uma espécie de subproduto. (...) Contra esta ‘doxa’, segundo penso, precisamos de nos defender submetendo-a à análise e tentando compreender os mecanismos segundo os quais é produzida e imposta.”Os pressupostos em que assenta o neoliberalismo serão irrefutáveis? Ou trata-se apenas de um “mito justificador”, de uma “ideia-força”, arquitectada em nome da globalização pelos responsáveis da alta política financeira, interessada em fazer regressar os eixos do mundo ao estádio do capitalismo selvagem? O que Bourdieu defende interessa a todos quantos não se conformam com a ideia de que a política é escrava da economia, deixando de ser a arte de construir o bem comum, para se entregar aos caprichos desumanos dos novos senhores da Terra. Mas interessa sobremaneira aos que não aceitam o argumento da inevitabilidade e sentem, até à medula, que o futuro está prenhe de possibilidades outras e mais justas. Mas então o que fazer? Antes do mais, desmontar esta pseudo-verdade, pondo a nú os seus mecanismos mistificadores. Depois, encarando-a como de facto ela é – nada mais do que uma “doxa”, uma opinião fundada em aparências. Por último, lutar, pois “não temos nós de lutar pela construção de um Estado supranacional, relativamente autónomo frente às forças económicas internacionais e às forças políticas nacionais e capaz de desenvolver a dimensão social das instituições europeias?”

Um comentário:

Carlos Medina Ribeiro disse...

Obrigado pela referência ao SORUMBÁTICO.

Abraço

CMR