segunda-feira, março 10, 2008

educação e os fins

Nas últimas duas semanas não se fala de outra coisa. Os protestos diários dos professores, que culminaram na imensa marcha da indignação (fala-se em cem mil) abriam espaços informativos nas televisões, deram azo à multiplicação de debates, ocuparam páginas e páginas de jornais e revistas, invadiram o universo da blogosfera, enfim, mobilizaram a opinião pública, incendiando os ânimos de todos quantos encaram a vida política e social como se de uma batalha campal se tratasse. Os media portugueses, sobretudo os televisivos, transformaram o assunto (demasiado sério) num folhetim de novela, em mais um enredo de herói e vilão, do género: “Professores ou Ministra, de que lado está a razão?” Deste modo, prestaram um mau serviço público.
É evidente que o problema da educação, mesmo em circunstâncias de um diferendo que opõe a razão corporativista dos profissionais do ensino à razão reformista do governo, não pode ser visto pelo prisma maniqueísta de vencedores e vencidos. Nenhuma das razões tem valor de verdade incondicional A questão é acima de tudo política, e é como tal que deve ser perspectivada. Ora, sendo a política a arte do possível bem comum a construir, o que, em democracia, pressupõe combate ideológico, não pode nenhum dos contendentes furtar-se ao diálogo e ao confronto de argumentos, sob pena de se cavar um fosso de tal modo intranponível que inviabilizaria de todo qualquer possibilidade de consenso. Isso seria uma machadada demasiado forte na democracia, o que nenhum governo eleito democraticamente poderia desejar.
As razões do governo, ainda que suportadas pelo peso da legitimidade representativa de uma maioria absoluta, do imperativo das reformas necessárias e inadiáveis da máquina do Estado, não podem ser apresentadas como dogmas e imposições definitivas. Elas pecam fundamentalmente por excesso de autoritarismo e por não se abrirem à ponderação de alternativas. Uma democracia sem ponderação de alternativas morre de asfixia. Cem mil professores a protestar nas ruas, a reclamar ser tido e achado em matérias que lhes dizem respeito, não podem ser votados ao desprezo ou sequer ao menosprezo. Não pode o governo pretender tratá-los como meros executantes passivos de uma reforma com a qual não concordam, e não deve voltar à estratégia da retórica do espezinhamento moral. Essa arma ignóbil deu agora os seus frutos: virou o feitiço contra o feiticeito e resultou numa união da classe como nunca antes se tinha visto.
Um dos erros do governo e dos responsáveis do Ministério da Educação foi não terem aproveitado as necessidades da reforma para chamarem a si os melhores professores, e para os envolverem no processo reformativo. Aproveitar a sua massa crítica teria certamente contribuído para a capitalização de uma mais-valia indispensável para o futuro a médio e a longo prazo do país.
Mas o erro maior do governo é não ter uma política educativa consistente. A sua cegueira econominista traduziu-se numa tentativa de reformar precipitadamente e por decreto. Isso não lhes permitiu parar para pensar um pouco, para reflectir sobre que portugueses se quer educar. Queremos formar tecnocratas oportunistas ou seres humanos dotados de espírito crítico e senso ético?
O melhor é dar a palavra aos sábios:
"Não basta ensinar ao homem uma especialidade. Porque ele se tornará assim uma máquina utilizável, mas não uma personalidade. Os excessos do sistema de competição e especialização prematura, sob o falacioso pretexto de eficácia, assassinam o espírito, impossibilitam qualquer vida cultural e chegam a suprimir os progressos nas ciências do futuro. É preciso, enfim, tendo em vista a realização de uma educação perfeita, desenvolver o espírito crítico na inteligência do jovem." (...) "A compreensão de outrem somente progredirá com a partilha de alegrias e sofrimentos. A actividade moral implica a educação destas impulsões profundas”. (Albert Einstein)

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