Nos últimos meses, o parque de Monsanto tem sido para mim uma caixinha surpresas. Comecei a frequentá-lo semanalmente, por necessidade. Não minha, mas do meu cão. O seu ethos obriga a passeios longos e musculados. Pelo menos quatro a cinco quilómetros (contabilizados no meu pedómetro) e uma hora de marcha. O cão, esse, percorre o triplo. Corre, salta, embrenha-se pelos arbustos dentro, desaparece e volta a aparecer, com a felicidade canina estampada no focinho de cachorro travesso. De uma vitalidade inesgotável, não pára quieto um segundo. São incontáveis as vezes que alça a pata e marca território em cima de pedras ou no tronco das árvores. Persegue à tonta o trinado e a sombra inquieta dos pássaros. E eu aproveito para oxigenar os pulmões e desentorpecer as pernas.
A minha descoberta do Monsanto tem sido paulatina e decorre ao sabor do acaso humano e da referida necessidade canina. Vou ensaiando percursos, experimentando trilhos novos, umas vezes próximo da mata de São Domingos, outras junto a Montes Claros, outras ainda perto do Alvito. A surpresa assoma a cada vislumbre de uma clareira, de um bosque frondoso e atapetado de folhas mortas. O inesperado espera-me a cada bifurcação de caminhos.
O meu último passeio, no Domingo passado, conduziu-me por carreiros esconsos e enviesados, por subidas suadas e descidas íngremes e vertiginosas. No coração da mata deparei amiúde com troncos caídos, lenha e mais lenha num torvelinho a que nenhuma mão humana acode e cuida. Perguntei a mim mesmo ou ao meu cão, já não recordo com nitidez. Por que ninguém limpa o pulmão de Lisboa? Não seria rentável pegar numa equipa de meia dúzia de homens e entregar-lhes a urgente tarefa de cuidar do parque de Monsanto? Não era possível vender as toneladas e toneladas de madeira para consumo das lareiras que a classe média paga a preços exorbitantes nos supermercados de Lisboa e nas lojas especializadas da periferia? O meu cão, é claro, não me respondeu. Continuou a farejar pedras e tufos de erva. E a alçar a pata para marcar um território que ele julga ser apenas nosso, dele o do seu dono.
Um comentário:
Enquanto os encontros em Monsanto forem pilhas de lenha ainda a coisa nao está mal. Ate breve
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